29/08/2018

18 [ RESENHA ] O Clube dos Jardineiros de Fumaça

Título: O Clube dos Jardineiros de Fumaça
Autora: Carol Bensimon
Editora: Companhia das Letras
Estrelas: 4/5
Livro: Cedido pela editora

Em um cenário formado por coníferas milenares, estradas sinuosas e falésias, a região californiana do Triângulo da Esmeralda concentra a maior produção de maconha dos Estados Unidos. É lá que o jovem professor brasileiro Arthur busca recomeçar a vida, depois dos acontecimentos que o levaram a deixar Porto Alegre. Aos poucos, ele se insere na dinâmica local e passa a fazer parte de uma história que começa com a contracultura dos anos 1960 e se estende até o presente. À vida de Arthur e daqueles com quem estabelece vínculos — o atormentado Dusk, a solitária Sylvia, a indecisa Tamara — mistura-se a de personagens reais que participaram do embate que levou à descriminalização do uso da maconha, fazendo deste um poderoso romance panorâmico. Cruzando história e ficção, com uma linguagem original e ousada, a meio caminho entre Brasil e Estados Unidos, Carol Bensimon compõe em O clube dos jardineiros de fumaça um brilhante retrato da geração hippie e de seu legado.
 

“-Você acha que o tempo está passando mais devagar ou mais rápido ou, de alguma maneira, diferente do normal? -Não parece diferente do normal. Só que… só que eu meio que perco a noção. Não sei se é cedo ou tarde… -Imagine que você tenha que se levantar e ir para o trabalho agora. Como você faria? -Eu acho que eu não daria a mínima para isso. -Bom, imagine que este lugar esteja pegando fogo.-Ia ser engraçado. -Ia ser engraçado? Você acha que teria o ímpeto de se levantar e sair daqui, ou você simplesmente ia ficar assistindo?-Eu não sei. Não me parece que o fogo represente nenhum perigo neste momento… tudo parece engraçado no Exército. -Tudo que as pessoas dizem parece um pouco engraçado… -É como se você estivesse de bom humor e pudesse rir de qualquer coisa? -Isso… é como sair com um monte de gente e daí todo mundo ficar rindo, todo mundo ficar só—
-Fazendo farra? -Aham. E tudo parece engraçado. -Você faria isso de novo? Faria esse teste de novo?-Aham. Claro. Eu não ia me importar nem um pouco.”

Arthur Lopes sempre foi um homem quieto e solitário, seu hobby desde a adolescência consistia em fumar maconha no escuro do seu quarto com seu único amigo, Fernando, ao som de rock clássico. No entanto, na sua vida adulta ele se tornara um respeitado professor de história na sua cidade em Porto Alegre, e apesar de sempre divagar sobre o quão comum e monótona era sua vida, um acontecimento o faz tomar uma decisão que mudará a sua vida de uma maneira que ele nunca imaginou.

Após ser preso por plantar maconha na estufa da casa de seus pais, Arthur não apenas perde o emprego como professor na escola onde lecionava, mas também perde qualquer oportunidade que ele poderia ter nesta profissão. Decidido a recomeçar a sua vida, Arthur se muda para a Califórnia, especificamente no Condado de Mendocino, por conter áreas amplas para o plantio da maconha. Mendocino Humboldt e Trinity formavam a região conhecida por Esmerald Triangle, o lugar de onde saía boa parte da maconha consumida no país. A referência à esmeralda veio do formato que os pés de maconha têm quando vistos de um helicóptero.

Em 1996, a maconha medicinal fora legalizada na Califórnia, de modo que ninguém precisava mais esconder os pés de suas propriedades. Nos dias atuais, não apenas a comunidade hippie tem interesse por esse material, mas também a maioria das pessoas em Mendocino vendia para o mercado ilegal, chamando atenção da polícia, que só poderia ser silenciada se também fosse compensada. Com isso, as pessoas desta região tornavam-se mais misteriosas em relação a esse assunto.

Depois de mentir para o seu pai sobre a sua localização e o motivo de sua viagem, Artur decide que queria aprender a plantar maconha, principalmente porque não tinha mais nada a perder. A partir dessa busca, somos apresentados a alguns personagens que Arthur irá conhecer ao longo da história.

O primeiro deles é Dusk, um homem de 70 anos, mas que aparentava ter 40 e que parecia uma mistura de hippie com bandido. Por conta de seu desconforto existencial, Dusk sempre esteve à procura de um lugar tranquilo onde ele pudesse se conectar com a natureza, construindo algo novo no meio do mato. Com isso, ele encontrara a Fish Rock Farm, uma comunidade hippie com vinte duas pessoas que viviam em completa harmonia. Até um rico artista de Los Angeles chamado Hans, se interessar pela propriedade e decidir comprá-la, construindo cabanas com preços altíssimos e que fizeram com que toda a comunidade saísse, incluindo Dusk. Revoltado, ele decidiu se mudar para um lugar nas montanhas a uns quinze quilômetros da cidade para plantar tomatillos. Com o incentivo de sua amiga, Tamara, Arthur queria que Dusk lhe ensinasse a plantar, mas para a sua surpresa ele recusa rapidamente.

A segunda personagem é Tamara, uma australiana de 42 anos, que após muitas desilusões amorosas e um relacionamento poliamoroso entre o seu ex-marido William Millner e uma jovem chamada Sarah, Tamara fica confusa e decide ir embora da cidade onde morava, em Bisbee, no Arizona.  Com o objetivo de pegar um ônibus para a Califórnia em busca de seu pai, Dusk, e de si mesma, Tamara e Arthur se conhecem na cafeteria onde ela trabalha como garçonete, desde então eles se tornaram grandes amigos. E apesar de haver algo mais entre eles, Arthur não queria confundi-la ainda mais com seus sentimentos.  

Tamara respira fundo, como se um pouco de maresia fosse restabelecer sua paciência com Arthur. Eles se conhecem há apenas duas semanas, mas ela já tem a sensação de que está sendo um pouco maternal demais, o que se revelou um erro em outros pontos da sua vida. É simplesmente angustiante agora perceber que isso vai continuar acontecendo. -Não é uma atividade como qualquer outra, Arthur. -Tudo bem, a gente não lê mesmo sobre isso nos folhetos turísticos. -A maioria vende pro mercado ilegal. Eles não têm licença nem nada. Eu não tô aqui há muito tempo, sabe? As pessoas também não saem me mostrando seus jardins. Não dá pra você só relaxar um pouquinho? Eles passam por uma fileira de hotéis cujos quartos têm varanda com vista para o mar e grandes portas envidraçadas. Um homem está fumando no segundo andar. É estranho ver a vida das pessoas acontecendo nos quartos, como se o prédio tivesse sido seccionado para um estudo antropológico.”


Após a recusa de Dusk em ajudar Arthur, Tamara decide arranjar um lugar onde ele pudesse morar e também encontrar o seu objetivo. Arthur iria morar na casa de uma professora aposentada, chamada Sylvia Watkins, em Albion. Sylvia era uma mulher de meia idade solitária e que a princípio não parece ser nem um pouco amistosa, mas conforme a história se desenrola, percebemos que assim como os outros personagens, ela também tem um passado ruim e que ainda a atormenta.  

“Albion, que foi dos índios Pomo em primeiro lugar, que foi dos lenhadores em segundo, mandando rio abaixo troncos gigantescos de sequoias vermelhas até a serraria lá do estuário a partir de 1853. Às vezes eles tacavam fogo em tudo e saíam da floresta como quem saía de uma mina de carvão. Depois Albion dos hippies. Terra barata. Gente nova chegando com ideias utópicas naquele lugar majestoso e quase abandonado desde o fim da indústria madeireira.”


Albion é uma propriedade rural, com pouca população, onde as estradas não pareciam levar a lugar nenhum, com isso, Arthur percebe que o local era tranquilo e realmente perfeito para plantar maconha, ele só precisava encontrar alguém que o auxiliasse nessa tarefa. E será neste momento que ele conhecerá o Clube dos Jardineiros de fumaça.



Uma narrativa fascinante, onde é possível o leitor se conectar com os personagens e se envolver rapidamente com a trajetória destes.
Arthur é um personagem bem intrigante, que possui um passado trágico, e que ao longo da história este vai sendo revelado de uma maneira bastante emocionante. A história é narrada em terceira pessoa, com isso, podemos conferir pela perspectiva não apenas de Arthur, mas também dos outros personagens. A autora também acrescenta histórias muito interessantes sobre a erradicação da maconha, na luta pela legalidade nos Estados Unidos, assim como versões fictícias de pessoas reais. A escrita é lenta, mas também bem divertida, contendo romance, fatos históricos e culturais. Vale à pena conferir!    
    
 
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18 comentários:

  1. Ainda nao conhecia esse livro, porem, achei muito interessante a historia, quem sabe entra na minha lista de leitura, adorei a resenha.

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    1. Oii! É uma história muito boa. Lê sim, espero que goste da leitura. Obrigada, fico feliz que tenha gostado <3.

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  2. Oi, Jenny!

    Muito boa a sua resenha e um livro muito bom, pelo que vi para podermos discutir pautas importantes como: a quem serve a legalização das drogas, que mal isso pode causar a tantas pessoas, mesmo que o livro em si, não traga essa discussão, mas faz refletir! Obrigada pela dica!
    Grande abraço,
    Drica.

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    1. Oi, Drica! Obrigada, fico muito feliz que tenha gostado da resenha. Simm, é uma história muito interessante e realmente nos faz refletir. De nada, espero que goste da leitura. Bjss! <3

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  3. Olá,
    Com licença.
    Permitam-me sugerir visita ao interessante blog do Artur Salles.
    www.artursalles.wordpress.com
    Atenciosamente,

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  4. Acho que a narrativa em terceira pessoa nesses casos só acaba facilitando, nos dá um panorama maior a respeito da história e o tópico da maconha sempre vem a calhar para que possamos compreender os motivos ou ausência deles para a possivel legalização também em nosso país, adorei a resenha!

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    1. Oii! Simm, eu também achei bem interessante a autora colocar o ponto de vista de todos os personagens. Aaah que bom, fico feliz que tenha gostado. Bjss!

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  5. Olá, tudo bem? Não conhecia esse livro ainda, mas a capa me deixou bastante intrigada e depois de ler tua resenha fiquei com mais vontade ainda de ler a obra. Adorei a dica!

    Beijos,
    Duas Livreiras

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    1. Oii! Tudo bem e você? Que legal que você ficou curiosa para conferir essa história, verdade a capa chama atenção haha. Espero que você goste da obra. Bjss!

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  6. Oii! Seja bem vinda, Lourdes! Esse blog não é meu haha, é da Taty que além de resenhista, também administra o blog <3. Mas fico muito feliz que você tenha gostado da minha resenha e pode nos visitar sempre. Pode deixar que irei conhecer e seguir o seu blog também. Bjss! <3

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  7. Olá, eu não conhecia o livro e mesmo tendo achado a sua resenha muito boa eu não me interessei pela leitura. Não que me pareça ser um livrou ruim, só não é o tipo de livro que me atrai com frequência.

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  8. Confesso que não é um tipo de leitura que me encha os olhos em nada, dificilmente me verei lendo esse livro tão cedo, mas ainda assim gostei da forma como abordou a história com claridade e sinceridade, parabéns.

    Beijos

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  9. Olá, a questão da maconha me repeliria de ler esse livro, mas eu achei os personagens bem interessantes e até fiquei com vontade de conhecê-los. Ótima resenha.

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  10. Oi, Jenny!
    Eu não conhecia a autora e também não conhecia a obra. Nunca imaginei que seria sobre o plantio e comércio de maconha e a sua resenha mostra personagens carismáticos que fazem valer muito a pena a leitura. Gostei.
    Bjos
    Lucy - Por essas páginas

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  11. Olá, tudo bem? Nossa nunca nem tinha ouvido falar do livro confesso, mas gostei da mistura que ele traz. Não consegui achar um gênero de encaixe para ele, mas o enredo é instigante. Gosto quando os leitores se identificam com os personagens e suas histórias. Sua resenha também me deixou bem curiosa sobre o mesmo! Por isso dica anotada <3
    Beijos,
    http://diariasleituras.blogspot.com.br

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  12. Olá, tudo bem? Eu nunca tinha escutado falar desse livro mas, amei essa capa e fiquei esperando algo no livro chamar mais a minha atenção do que ela. A história do Artur é bacana afinal, ele faz uma mudança radical na vida dele, mudar para outro país e aprender a plantar maconha é algo muito sério e para mim vai além da discriminação que ele sofreu na casa dos pais mas, pela sua resenha eu não consegui descobrir qual o foco do livro e como os personagens desenvolverão ele, vou pesquisar um pouco mais sobre ele para formar uma opinião concreta.

    Beijos e Abraços Vivi
    Resenhas da Viviane

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  13. Eu gosto de narrativas assim, justamente por poder saber a visão de outros personagens. Não conhecia o livro ainda, mas valeu pai dica.
    Bjos Rose

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  14. Olá,
    Acho que o tema deste livro é daqueles temas que eu realmente não entendo de nada com nada, no caso da legalização da maconha e tal. Gostei do fato de ser em terceira pessoa, creio que livros em primeira pessoa 'perdem' muitas situações em volta. Mesmo que não seja algo que seja tão atraente quanto leitura para mim, eu leria só pra saber mais do assunto mesmo.

    Debyh
    Eu Insisto

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